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Ruta dos siete lagos - Nahuel Huapi

Foto do escritor: PéterPéter

Atualizado: 23 de mai. de 2018



Contávamos pousar uma noite em Vila La Angostura mas, uma vez que esta não nos agradou, fizemo-nos à estrada em direcção a Bariloche. A nossa seguinte paragem surgiu literalmente ao virar da esquina.

Seguíamos pela famosa Ruta 40, quando de repente entre os arbustos que ladeavam a estrada, vimos uma pequena abertura ao longo duma curva. Demos meia volta e fomos espreitar. O estreito trilho descia até um pequeno areal. À sua frente estendia-se toda a bacia do gigante lago Nahuel Huapi e as suas respectivas montanhas no horizonte. Paradisíaco. Sem ai nem ui, espetamos o carro em cima da areia, e ali nos alapamos, para passar dois maravilhosos dias.



Uma viagem como esta tem diferentes tempos e ritmos. Por vezes, estamos com o pé no acelerador da vida, por outras estamos de férias das férias. Somos uma partitura bem irregular ao som dos uivos e sopros da América. O momento de acampamento é delicioso. Ocupamos o nosso tempo com nada. O dia passa e o peito fica preenchido. Cozinhamos coisas novas, comemos com dedicação, fazemos fogueiras, conversamos com curiosidade, lemos e passeamos.



É um tempo de sentir e estar. Não de visitar e partir. Esta dualidade era ainda um grande problema no qual reflectíamos sob a margem do lago. Enquanto preparávamos a viagem, também a imaginávamos. E a nossa imaginação fazia-nos crer que a viagem iria estar repleta deste tipo de tempo, calmo como a ondulação do grande Nahuel Huapi. Mas não. Rapidamente percebemos que um ano é muito pouco tempo para viajar por todo este continente. Ao contrário do que desejávamos, o tempo rápido de visitar e partir não é a excepção, mas sim a regra. Em parte, deve-se ao facto de na preparação não termos imaginado um pequeno pormenor, a distância. Isto é realmente grande. Dias há em que poderíamos ter atravessado Portugal de norte a sul, e apenas nos cruzamos com dois pueblitos pequenos, como já aconteceu.



Bem viva e poderosa, como aquela massa de água que se estendia aos nossos olhos, a Catarina já tinha aceitado que a nossa imaginação era parte do passado. O presente exigia de nós uma adaptação para seguir viajando. Mas eu quis inventá-lo onde ele não existia, quis engavetá-lo onde ele não cabia. Durante alguns dias carreguei comigo a frustração de “as coisas não estarem a correr como eu queria”. Este fardo gerou umas quantas discussões entre nós e estragou uns quantos sorrisos pelo caminho. Por ironia, precisei de mais tempo para aceitar que não temos assim tanto tempo.


É fundamental aprendermos com a nossa própria viagem. Todos os ensinamentos que ela nos dá, não só irão melhorar sempre esta experiência, como podem todos eles ser aplicados no resto da nossa vida. Na realização dum filme sempre considerei que se o resultado final é tal e qual o que está no guião, é porque algo de errado aconteceu. Por mais que esteja muito bem conseguido, é anti-natural que por entre as várias fases de trabalho, as coisas não se tenham alterado quase sozinhas. Pois o processo de fazer um filme é orgânico, tão vivo e independente como um sapo ou uma libelinha. A viagem também tem vida própria. Temos que gerir as expectativas e aceitar como a realidade se revela. Se o fizermos, nada de desgostoso vamos reconhecer no percurso, mas sim seremos cada vez mais capazes de desfrutar.


Entretanto, sempre na companhia do lago, o tempo passou a correr. Ao fim do segundo dia partimos rumo a Bariloche. Por coincidência, demos lugar a outra Volkswagen. É como se nos levantássemos do sofá e o próximo a sentar-se aproveita a covinha que deixamos. Mas esta não era bem igual à nossa, na verdade. Era francesa, pertencia a um casal mais velho, tinha tracção às quatro rodas e tecto alto. Não fiques triste Patassaura, mas cá entre nós, quem nos dera!


27 e 28 de Fevereiro, 2018

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