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Não chores por mim, Brasília!

Foto do escritor: PéterPéter


Nunca tivemos a intenção de visitar profundamente Brasília, contudo devido a novos problemas mecânicos ficamos a conhecer a cidade de fio a pavio. Principalmente as zonas industriais. Precisávamos de trocar urgentemente os amortecedores, resolver uma fuga de água que estava remendada pelo meu amadorismo, trocar os discos já bastante gastos dos travões, resolver um problema eléctrico e trocar o filtro do diesel. Peças suplentes para o nosso carro é praticamente impossível encontrar. Existem em São Paulo e em algumas cidades da Argentina. Depois de uma série de contactos telefónicos com importadores de peças, decidimos tentar resolver e procurar por nós mesmos na capital federal.



Durante seis meses percorremos o Brasil com um total de cerca de 10 mil km. Em todo esse espaço de tempo não encontramos nenhum carro igual ao nosso, apesar de sabemos que existem uns poucos. Justamente quando estávamos presos no trânsito no meio da capital brasileira, passou por nós uma VW T4 igualzinha à nossa e muito bem tratada. O dono daquela carrinha devia ter informações valiosas sobre como arranjar peças suplentes. Acelerámos, tentamos furar o trânsito, perdemos a carrinha de vista e tornámos a encontrar. Buzinei, abri a janela e aos berros perguntei. “onde compro peças em Brasília, cara?!”. Sem grande interesse e, na verdade, meio atordoado pela minha apresentação, respondeu-me simplesmente “na internet” e desviou o olhar. Ficamos desanimados, mas rapidamente passou. O homem, que afinal era bem simpático e colaborativo, deve ter absorvido melhor a situação, pensou duas vezes, encostou à nossa frente e fez-nos sinal para encostar também. Falámos um pouco, deu-me dicas muito úteis e ainda se voluntariou para comprar peças em São Paulo, caso fosse preciso, uma vez que iria lá em dois dias. Acabámos por encontrar tudo o que necessitávamos em Brasília. Implicou uma série de voltas e revoltas, muita paciência e filas de espera, mas conseguimos.



Através de um grupo de apoio a viajantes no Brasil, conseguimos algumas sugestões de mecânicos na cidade. Foi por aí que começamos. Entre outras tentativas, acabámos por ir parar a uma oficina chamada DF Diesel. Quando chegámos à porta, vimos as imensas van e micro-bus locais, tudo em fila de espera. Por um lado era bom sinal, pois significa que o serviço é bom e ao preço local, por outro lado talvez nos fizessem esperar bastante tempo. Entrei na oficina e fui de imediato bem recebido pelo dono. Expliquei o que necessitava, percebi pelo seu discurso que me ia ajudar em relação ao preço do serviço, mas sempre com aquele compromisso de não querer gastar muito tempo comigo, uma vez que também não ia ganhar muito dinheiro comigo. É como se nos dessem uma mão e tirassem outra, porque, claro, ficámos agradecidos pelo desconto, mas por outro lado sentimos que o serviço é despachado e sem grande tempo para averiguar outras situações que eventualmente apareçam. Aí conseguimos então trocar os amortecedores (finalmente!), os discos de travão, resolver a fuga de água e o trocar o filtro do diesel.



Ainda tivemos tempo para visitar um pouco o lado turístico da cidade. Brasília é estranha, foi a nossa conclusão. É uma cidade pensada unicamente para andar de carro. A sua arquitectura e desenho simétrico e geométrico apresenta soluções muito bem pensadas a nível de organização e disposição de serviços, contudo para o nosso gosto falta um lado orgânico, mesmo que seja uma cidade. Aproveitámos também a presença na última grande cidade brasileira e fomos a um alfarrabista aconselhado pelo Igor. Perdemos a cabeça e comprámos livros até ao final da viagem. Nós gostámos de falar e aprender espanhol, mas torna-se cansativo ler num idioma que não é o nosso, mesmo que isso ajude a melhorar a nossa gramática e vocabulário.



O resto do caminho até à fronteira foi a par e passo, mesmo não sabendo muito bem o que essa expressão significa. Fomos parando e partindo. Pelo caminho encontrámos Jesus no meio duma avenida caótica, conhecemos capivaras amistosas, tomamos cerveja com um ex-pastor evangélico e gastámos uma fortuna em fios de tricot para a Catarina aprender a fazer roupa para toda a família!




Para trás ficou um Brasil imenso e intenso, que representou uma viragem na nossa aventura e nas nossas vidas também. Foram seis meses inesquecíveis. Seis meses de amor, harmonia, conflitos e resoluções. Obrigado a todos que se cruzaram connosco pelo caminho e, mesmo sem saberem, sempre foram deixando uma aprendizagem, uma inspiração, uma vontade de modular, adoptar e incorporar. É noiz!



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