San Ignácio é uma vila bonita, assim como todas as que fazem parte da região da Chiquitania. A presença arquitectónica espanhola faz-se sentir, principalmente nas praças centrais, que estão sempre muito bem cuidadas e com jardins limpos. Esta região representa o lado mais oriental da Bolívia, onde o clima ainda é algo tropical, sendo possível a plantação de bananas e cacau.
Precisamente por causa do clima quente e húmida, decidimos brindar-nos com um banho na piscina municipal. Ao início tínhamos o espaço só para nós, mas com o passar do dia algumas famílias foram chegando. Foi a oportunidade de tomarmos contacto com um dos muitos hábitos sociais peculiares bolivianos: as esmagadora maioria das pessoas banha-se de roupa. Calças e camisolas, mesmo fazendo calor! Assim como tantos outros comportamentos sociais do país, tivemos alguma dificuldade em compreender o porquê. A conclusão a que chegámos, mas que se calhar é demasiado presa ao nosso ponto de vista e padrão ainda demasiado Europeu, é que eventualmente as pessoas têm algum budismo em mostrar os seus corpos. Homens e mulheres. Lembramo-nos desta hipótese, pois de facto há muita gente gorda, que acreditámos que seja fruto dos maus hábitos correntes de alimentação. O mais impressionante é a quantidade de crianças obesas, como de resto já referimos aqui acontece um pouco por todos os países onde já estivemos.
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Enquanto descansávamos da água, conhecemos um grupo de três amigos adolescentes. Cativados pelas minhas tatuagens - e talvez também por a Catarina estar em biquini! - decidiram meter conversa. Eram muito simpáticos e conversadores. Propuseram-nos ir mostrar-nos a gruta de gesso, um dos atrativos naturais da vila. Enfiámo-nos todos no carro e lá fomos na companhia do grupo entusiasta. Um dos rapazes tocava violino num grupo folclórico local e, na despedida, propus-lhe encontramo-nos de novo no dia seguinte para fazermos um vídeo consigo a tocar. Excitado com a ideia, aceitou prontamente. Infelizmente, devido a um erro na troca dos contacto telefónicos nunca mais nos encontramos.
Aproveitei a vontade de fazer algo e despendemos uma manhã a percorrer os vários hotéis da vila. Comigo levava um pequeno portfólio de fotografias da nossa viagem e, apresentando-me como fotografo profissional, propunha um serviço de fotografias aos quartos, café da manhã e demais espaços do hotel por um preço de 10 bolivianos por imagem. Ao fim duma rondada gigante, acabámos por encontrar Don Costaleite, o proprietário do Hotel Don Ignácio, que ficava mesmo de frente para a praça central. Entusiasmado com as fotografias que lhe passei para a mão, aceitou a nossa proposta.
Nessa mesma tarde, pusemos mão ao serviço e com a ajuda da minha maravilhosa assistente Catarina Inês, produzimos 24 imagens entre três quartos, sala de refeições e o jardim do hotel. O que equivalia a 240 Bolivianos. Mesmo sem ver as fotografias finalizadas, Don Costaleite propôs-nos trocar o serviço por uma estadia num dos quartos à nossa escolha. Uma vez que o preço por pernoite era de 350 bolivianos, acabámos por ficar a ganhar. O quarto não era especialmente cómodo ou bonito, mas já necessitávamos com alguma urgência duma ducha calma e tranquila. Assim, aproveitámos para dormir numa cama maior, usar a internet (que também não era assim tão rápida) e ver clássicos do cinema de entretinimento americano dobrados em espanhol. Para além disso, na manhã seguinte ainda tivemos direito a um modesto pequeno almoço de hotel.
Don Costaleite passou as fotografias para o seu computador, elogiando a sua beleza, mas sem grande entusiasmo. Até hoje ficámos com a impressão de que aquelas imagens nunca vão realmente ser usadas para alguma coisa. Desconfiámos que como o senhor simpatizou connosco, a sua ideia era desde o início oferecer-nos uma estadia para descansarmos melhor. Assim sendo, na verdade as fotografias tiveram sim uma finalidade. E depois de acolhidos com mais um gesto de ajuda e compaixão retomámos a estrada com um brilho no coração.
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Até Santa Cruz de la Sierra fomos visitando ao de leve os restantes pueblos que nos ficavam pelo caminho. Saímos da região da Chuiqitania com a sensação de que esta entrada na Bolívia não poderia ser mais acolhedora e motivadora.
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