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Em cada esquina um amigo

Foto do escritor: PéterPéter

De casa arrumada e com a ligeira noção de que trouxemos tralha a mais, fizemo-nos à estrada. A ideia seria ir até Cabo Polónio e fazer todo o caminho pela costa até à fronteira com a Argentina.


A primeira paragem foi Minas, uma pequena cidade perdida no meio do nada. Chegamos ao final da tarde e aparcamos em frente à esquadra da Polícia, pois rapidamente percebemos que não haveria muito para visitar e que no dia seguinte partiríamos cedo. Por sorte, esta era uma rua muito sossegada e transversal à praça central, onde fui fumar um cigarro depois de jantar.


Detive-me a observar. A noite era quente e a praça estava repleta de famílias, cada uma com uma mão cheia de crianças. Uns corriam, outros jogavam à bola, uns dançavam e outros banhavam-se nos repuxos. Mas ninguém se atrevia a sentar o rabo nos grandes jardins de relva fresca. Era proibido! Assim, abria-se a época de caça aos bancos que se espalhavam pelos corredores, fazendo lembrar o jogo da cadeira. No banco em frente ao meu, chegaram duas mulheres, aproveitando fugazmente uma vaga. Tinham consigo um bebé, que colocaram no chão, para que brincasse aos seus pés, enquanto conversavam animadamente. Achei peculiar. Imaginei a minha irmã se fosse mãe, e diverti-me com o quão diferente seria a experiência dela em vir à praça com uma criança. De sorriso tonto na cara, levantei-me e dei lugar a outros.


De volta à carrinha, a Catarina e a Levi já dormiam. Sentei-me no banco da frente a ler um livro. A porta da casa em frente à qual estacionáramos, abriu-se. Um senhor, com os seus 60 e alguns anos, sentou-se no pequeno degrau, a beber o seu mate. Como viria a ser costume, os seus olhos prenderam-se na matrícula do carro, e movido pela curiosidade, levantou-se para meter conversa.

Contei-lhe quem somos, de onde vínhamos e para onde íamos, com todos os pormenores que a sua atenção rigorosa merecia ouvir. Como todos os Uruguaios, falou-me do seu país com paixão, descrevendo-me todos os lugares de forma entusiasmante e recomendando-me visitar todos os lugares. Genuinamente, ainda quis também saber com eram as coisas em Portugal. Ficamos cerca duma hora à conversa, os dois sentados ali no pequeno degrau da porta. Por fim, o homem desapareceu porta a dentro e apareceu a sua esposa.


Com um sorriso, disse-me que adoraria um dia ir a Fátima, e que uma vez quase ganhou uma viagem num concurso da sua paróquia. Em Maio, iria pela primeira vez à Europa, num encontro mundial organizado entre várias igrejas, no Vaticano. Mas como primeiro passaria uns dias em Madrid, resolveu pedir-me conselhos sobre que roupa deveria levar para a Primavera na capital espanhola. Achei precioso que como para alguém dum país e continente muito maior que os nossos, a noção de distância seja completamente diferente. Para esta senhora os cerca de 600km que separam Porto e Madrid, não são nada. Por isso, seria completamente natural, que como português, eu tenha conhecimento de que como estarão os dias em Madrid nesta altura do ano. Acabei por recomendar que levasse roupa fresca e um casaco para pôr pelos ombros ao final da tarde.


No entretanto, o marido regressou. Consigo trazia um papel, onde tinha escrito todos os possíveis caminhos até Cabo Polónio. No final, acrescentara ainda outras cidades que poderíamos visitar e desejava-nos sorte e uma boa viagem! Foi com esse mesmo papel na mão e com dois alfajores na barriga, que no dia seguinte seguimos viagem.




1 de Fevereiro, 2018

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